Volkswagen quer que etanol seja ponte para eletrificação
Divisão brasileira da marca será polo de desenvolvimento de uso do combustível em híbridos, solução que pode ser exportada para países como África do Sul e Índia
Desde que a produção e o uso de carros elétricos passaram a se expandir em mercados desenvolvidos, surgiu uma preocupação em torno das fábricas em países emergentes, como o Brasil. Esse parque industrial, erguido quando só havia motores a combustão, está fora do mapa de desenvolvimento e produção de novas gerações de veículos.
Indústria, governos e consumidores de países emergentes precisam de um tempo maior para entrar na era da eletrificação. Apenas a produção em massa desse tipo de veículo poderá tornar seu custo mais próximo dos valores de um carro movido a gasolina ou álcool. A questão é como fazer essa transição.
O Brasil é o nono maior produtor mundial de veículos. Não pode se dar ao luxo de esperar as coisas acontecerem. Fábricas podem continuar fechando, como a Ford. Naturalmente, montadoras passariam a importar o que hoje produzem aqui.
A discussão de incluir etanol na transição para a eletrificação tem mais adeptos a cada dia. Há 48 anos o país produz motores movidos com o combustível da cana e desde 2003 vende carros flex, que podem ser abastecidos com gasolina, etanol ou qualquer mistura de ambos.
Defensores dessa tecnologia justificam que o veículo elétrico pode poluir mais que um a etanol se a energia não vier de fontes limpas. Caso da China, que ainda gera energia em usinas termelétricas a carvão. O etanol leva vantagem quando se calcula todo o processo de produção — da plantação da cana ao sequestro de carbono no cultivo.
Não basta, porém, o etanol ser opção indiscutível. Para seu uso, os carros teriam de continuar a ser feitos no sistema tradicional, com motor a combustão. Mas não é o que ocorre no mundo. Novos projetos são todos baseados na eletrificação e países mais ricos já fixaram prazos para eliminar a combustão das ruas.
Chama a atenção o ritmo crescente de propostas dirigidas ao uso do etanol em híbridos, como já faz a Toyota do Brasil, ou a torná-lo base das futuras células de combustível, como tem feito a Nissan. Há poucos dias, surgiu outra ideia inovadora, da Volkswagen, também voltada à aplicação de motores flex em híbridos: investir para fazer do Brasil seu centro mundial de pesquisa e desenvolvimento da tecnologia.
A VW pretende exportar tecnologia e motores flex para países da América Latina, África do Sul e Índia — que recentemente autorizou a venda de etanol puro nos postos. A Índia é o sexto maior produtor de veículos do mundo e, como ocorre no Brasil, elétricos são uma realidade ainda distante da classe média.
“Pode ser uma forma de fazermos uma nova indústria”, disse o presidente da VW na América Latina, Pablo Di Si. Há dias, o presidente da Stellantis na América do Sul, Antonio Filosa, destacou, em artigo no Valor, que a capacidade de fazer biocombustíveis sem competir com a produção de alimentos “confere ao Brasil vantagem comparativa única de fazer transição planejada para a era da mobilidade de baixo carbono”.
Se nada for feito, fábricas do país podem ficar obsoletas em poucos anos. A adaptação aos tempos atuais da tecnologia conhecida aqui há quase meio século pode, porém, evitar que uma indústria com alta participação no PIB do Brasil venha a se transformar num parque industrial fantasma.