Plano Nacional do Hidrogênio envolve novas perspectivas para o etanol
7,6 litros de etanol são capazes de gerar 1 kg de hidrogênio
O Ministério de Minas e Energia (MME) apresentou na quarta, 4, as diretrizes do Plano Nacional do Hidrogênio (PNH2). Como adiantado pela agência EPBR, a estratégia é facilitar as diferentes rotas de produção do combustível.
O conjunto de diretrizes entregue ao Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) prevê ainda a criação de um Comitê Técnico, com seis eixos de atuação.
Entre as diretrizes, estão: aproveitar o gás natural nacional com captura e armazenagem de CO2 para produção de hidrogênio azul; valorizar a competitividade das renováveis para o hidrogênio verde; e explorar as possibilidades trazidas pelos biocombustíveis, como etanol e biogás.
Um caminho é a produção de hidrogênio pela reforma a vapor do etanol e outros biocombustíveis e a biocaptura de carbono (BioCCS).
“A fórmula química do etanol – C2H5OH – mostra que ele tem bastante hidrogênio. Existe no Brasil uma tecnologia única no mundo de conversão de etanol em hidrogênio”, conta o presidente do Sindicato da Indústria de Fabricação do Álcool do Estado da Paraíba (Sindalcool), Edmundo Barbosa.
Segundo o executivo, 7,6 litros de etanol são capazes de gerar 1 kg de hidrogênio. “Esse caminho, ainda em construção, vai nos levar a regiões onde temos excesso de etanol; isto é, tem etanol e não tem mercado. E vai favorecer outras indústrias”.
Ele explica que há uma demanda pela indústria siderúrgica, leiteira e de óleos vegetais por hidrogênio, mas o insumo está atualmente muito concentrado no litoral, onde estão as refinarias de petróleo – já que todo o hidrogênio produzido no Brasil é de fonte fóssil.
Ao mesmo tempo, o uso do estanol supre uma demanda crescente por descarbonização.
Além disso, ao contrário do hidrogênio verde produzido a partir de eletrólise com energia renovável, cujos projetos anunciados no Brasil focam na exportação para o mercado europeu, o hidrogênio a partir de etanol será destinado ao mercado interno.
Hidrogênio, etanol e eletrificação no transporte
Quem também pode absorver esta demanda é o setor de transportes. O PNH2 sinaliza o uso de hidrogênio no transporte pesado – caminhões, locomotivas, aviões e navios –, considerado um setor mais difícil de descarbonizar.
Mas o setor de etanol também vê uma oportunidade nos veículos leves. Nos planos de descarbonização da indústria automotiva, a célula a combustível a hidrogênio surge como uma solução de baixo carbono para a eletrificação da frota.
“Há uma ação agressiva de países europeus no sentido de promover a produção de hidrogênio a partir da eletrólise. O nosso interesse é produção de hidrogênio a partir do etanol”, diz Barbosa.
Embora a célula a combustível ainda esbarre em dificuldades tecnológicas quando o assunto é transformar o etanol em hidrogênio no veículo, a tecnologia que faz essa conversão – o reformador – já está madura para instalação em postos de abastecimento, afirma o executivo.
“Hoje, já conseguimos fazer 20 metros cúbicos de hidrogênio por hora e vamos, em pouco tempo, escalar para 200 metros cúbicos por hora a partir do etanol. Esta tecnologia está madura e já é comercial”, garante.
Ele explica que a vantagem de ter um reformador de etanol em postos é o transporte, já que o hidrogênio é 100 vezes mais volátil que a gasolina, por exemplo. O etanol seria, então, uma espécie de hidrogênio líquido e não exigiria mudanças na infraestrutura de distribuição.
Barbosa ainda afirma que, com unidades reformadoras nos postos, o etanol continuaria sendo transportado das usinas para distribuidoras e postos, sem precisar de “investimentos vultosos em infraestrutura de distribuição, como na Europa, por exemplo”.
“O desafio é vencer a nossa baixa eficiência energética, e em todos os setores”, afirma e completa: “Quando abastecemos com R$ 100, nos motores de ciclo Otto, só R$ 26 são convertidos em transporte. Todo o restante é disperso em uma forma de calor”.
Ainda de acordo com ele, a indústria automotiva está buscando uma parceria no etanol. “Ela vai se dar através de veículos a hidrogênio. Precisamos estar abertos para essa possibilidade”, completa.
Viabilidade econômica
Barbosa vê a precificação do hidrogênio acontecendo de uma forma semelhante à vista na Política Nacional de Biocombustíveis (RenovaBio). O programa dá aos produtores de biocombustíveis a possibilidade de emitir créditos de descarbonização com base na sua nota de eficiência energética e ambiental.
“Provavelmente, o hidrogênio verde vai ser negociado com formação de preço em bolsa para que se alcance, realmente, a redução de custo desejada. E para que a gente consiga ter financiamento”, afirma.
Mas há um motivo para os projetos anunciados de hidrogênio verde estarem concentrados nos portos brasileiros visando exportação: os países ricos têm condições de alocar recursos para usar esse combustível na transição.
No caso do Brasil, será preciso uma estratégia para viabilizar economicamente o hidrogênio de baixo carbono.
“A viabilidade econômica disso vai se dar a partir dos fundos de investimento agropecuários. Vamos ter financiamento através do mercado, em função realmente dos benefícios ambientais e agregação de valor trazida pelo hidrogênio”, aposta.